Caos, dramas, colisões, ultrapassagens, lutas intensas e batalha directa entre os candidatos ao título… até com ajuste de contas, tudo a terminar com um vencedor surpresa e o mais jovem estreante de sempre no pódio! Foi tudo isto que se passou hoje no G.P. do Azerbaijão, a corrida mais louca dos últimos anos, em que Daniel Ricciardo conseguiu a sua quinta vitória na F1, mas em que a bizarra celebração do piloto da Red Bull, a beber champanhe da própria bota, ainda foi… o menos inesperado!
Se alguém tinha dúvidas quanto à capacidade de um circuito citadino de altíssima velocidade (média da «pole» acima dos 210 km/h) proporcionar uma corrida agitada, ei-las desfeitas… Baku ofereceu-nos um espectáculo notável, com todos os ingredientes, os esperados e muitos inusitados. Ao fim de mais de duas horas, foi uma pena a corrida ter acabado porque ainda havia tanta emoção para ser vivida, tantos mais episódios para acontecer!
E mesmo quando a luta pelo título estava ao rubro, com Hamilton a atacar Vettel, já em zona de DRS, passando pela última vez na meta separados por 0,2 s! O suficiente para o alemão da Ferrari lhe ganhar mais dois pontos no Mundial, passando a ter 14 de avanço, enquanto nos Construtores a Mercedes fez muito melhor colheita, aumentando a sua vantagem sobre a Ferrari para 24 pontos. Olhando agora para a corrida, contudo, Vettel estará a recriminar-se por ter sido tão… latino a certa altura, pois teria ganho facilmente esta prova e estaria agora com 27 pontos de vantagem. Ou como um tetracampeão também perde o autocontrolo… Mas já lá vamos.
A corrida conheceu logo uma reviravolta após a segunda curva, com Sebastian Vettel a recuperar bastantes pontos a Hamilton ao saltar para 2.º, por se aperceber de forma astuta do que se estava a preparar à frente dos seus olhos: Raikkonen tentava passar Bottas por fora, o Mercedes pisou demais o corrector interior e foi projectado contra o Ferrari. Os dois finlandeses voltavam a «contactar-se», com piores resultados para o da Mercedes que ficou com a asa danificada e o pneu dianteiro furado, acabando a perder uma volta.
Na frente, a luta pelo título estava relançada, com o duelo directo entre Hamilton e Vettel, embora o Mercedes conseguisse fugir de forma aparentemente fácil, ao ponto de o tricampeão se preocupar com o colega de equipa e querer saber pelo rádio o que se passara com Bottas. Na confusão, Perez conseguiu colocar o Force India no mesmo lugar do pódio que ocupara em 2016, mas começou de imediato a ser pressionado por Verstappen… até o holandês ser de novo traído pelo seu motor, coleccionando o quarto abandono nas últimas seis corridas!
Os detritos deixados pelo toque de Bottas em Raikkonen que entupiram algumas condutas de arrefecimento de travões (Ricciardo e Hulkenberg, por exemplo), mais a paragem do Toro Rosso de Kvyat levaram à primeira entrada do Safety Car e, a partir daí… foi o descontrolo total de uma corrida que se tornou caótica!
A cada relançamento da corrida havia toques e pedaços a saltar, enchendo a pista de mais detritos que voltavam a obrigar a colocar o «safety car» em pista… Numa dessas alturas assistiu-se a um episódio bizarro que ainda fará correr muita tinta: Hamilton abrandou para arranjar espaço para o «safety car» e preparar a partida e Vettel acertou-lhe na traseira ficando sem um elemento da asa; o alemão, furioso, colocou-se ao seu lado e bateu propositadamente no Mercedes enquanto reclamava! Uma reacção intempestiva do homem da Ferrari que lhe custaria caro…
Mas o caos continuava e, tendo dado liberdade aos seus pilotos para se baterem, a Force India viu Ocon acertar em Perez… e perder preciosos pontos! O francês furou, o mexicano ficou com um tirante da suspensão partido e… Raikkonen ficou com o outro lado do Ferrari afectado ao passar pelos destroços, deixando o SF70H como que saído de um «derby» da destruição! Mas a pista estava tão suja que não houve outra solução senão parar mesmo a corrida, à 22.ª volta, o que até deu tempo às duas equipas para repararem os carros de Perez e Raikkonen, adiando dois abandonos…
Foi quando os pilotos se voltaram a sentar nos seus carros – várias equipas fizeram pequenas reparações e trocaram pneus, a Ferrari mudou mesmo a asa dianteira de Vettel – que Hamilton… perdeu esta corrida. Mais um episódio bizarro mas, por erro na colocação ou por defeito da peça, a protecção da cabeça viria a ficar solta e mesmo com as tentativas do piloto de a fixar (chegou a fazer a recta da meta a 330 km/h a guiar só com uma mão!), Hamilton teve mesmo de ir à «box», montar uma nova protecção.
Festa na Ferrari? Isso era se Vettel não se tivesse comportado como um «troglodita da selva urbana», sendo por isso condenado, por condução perigosa e por ter provocado uma colisão, a um «stop & go» de 10 segundos. «Não quero saber desse incidente, já passou e temos de seguir em frente», começou por dizer Hamilton que, ainda assim, deixou uma crítica velada: «Não tem bem a ver com a conduta do piloto, é apenas condução perigosa e ser penalizado com 10 s por isso… Não preciso de dizer mais». Vettel levou ainda mais 3 pontos na superlicença, totalizando já 9. Se receber mais 3 na próxima prova (porque há 2 que caducam na seguinte, Grã-Bretanha, por já ter passado um ano), atinge o limite de 12 que dá uma corrida de suspensão!
Já Vettel mostrava-se consciente do que tinha feito e nunca falou na «carga punitiva» a Hamilton, ficando-se apenas pelo incidente inicial: «Não aconteceu nada, pois não?!… Ele fez-me um ‘brake test’ [travagem forte num local inesperado para assustar quem vem atrás], o que esperava? Causou-me danos e podia ter ficado com danos. Já há alguns anos fez a mesma coisa na China, aquilo não é maneira de preparar o recomeço da corrida. Após o incidente pus-me ao lado dele e levantei a mão para lhe mostrar que não estava satisfeito». Sobre o ter atirado o Ferrari para cima do Mercedes nem uma palavra mas, a esta hora estará bem arrependido… Ainda assim, o alemão saiu da «box» mesmo à frente de Hamilton e os dois atrás de (lembram-se dele?) Valtteri Bottas que caíra para último no início, chegando mesmo a perder uma volta que recuperara no primeiro «safety car».
No meio de toda esta loucura, quando a corrida recomeçou, Daniel Ricciardo tinha feito uma espantosa ultrapassagem dupla, deixando para trás os dois Williams (sendo que Massa abandonaria logo a seguir). E com as paragens de Hamilton e Vettel, o australiano via-se na frente da corrida, seguido pelo jovem Lance Stroll que, ao longo de todo o fim-de-semana, numa pista difícil e totalmente desconhecida, conseguiu andar depressa sem pôr uma roda no sítio errado! Também por ali andavam Magnussen (Haas) e Ocon (Force India), mas esses foram presas fáceis para a «cavalaria» que vinha atrás (Bottas, Vettel e Hamilton).
Numa pista com duas zonas tão grandes de DRS, mesmo que quisesse (o que não é óbvio), Bottas não poderia esperar por Vettel para ajudar Hamilton, pois arriscava-se a ser facilmente passado. E o finlandês passou ao ataque, procurando recuperar a desvantagem substancial para Stroll, enquanto Hamilton tudo fazia para atacar Vettel. Foi um final de corrida intenso, com aqueles três a andarem nos limites e a baterem o recorde da pista volta após volta (ficaria na posse de Vettel).
Bottas conseguiria os seus intentos, passando Stroll mesmo em cima da meta e consumando uma recuperação de último a uma volta dos primeiros… até 2.º! Hamilton só nas últimas duas voltas entrou na zona de DRS de Vettel mas, mesmo assim, sempre demasiado longe para o ameaçar, cortando a meta a 0,2 s do alemão.
Na frente, o sorriso de Ricciardo parecia transbordar do capacete… «Isto foi divertido!», comentava antes de subir ao pódio onde diria: «Foi uma corrida louca, sabíamos que o pódio era uma hipótese, mas depois, com os problemas do Lewis e do ‘Seb’, conseguimos isto! No início tive de parar na ‘box’ por causa de detritos nos travões e caí para 17.º, nessa altura apostaria todo o meu dinheiro contra este desfecho…». E de pensar que, na qualificação, Ricciardo tinha batido no muro! «Ontem foi uma desilusão com o erro que cometi, mas temos de os cometer para encontrar os limites… Hoje só queria manter-me longe dos problemas e… sinceramente estou sem palavras, na volta de regresso às ‘boxes’ não parava de me rir, parecia um miúdo…».
O miúdo australiano lá fez o incontornável «shoey», mas não convenceu Bottas que quase fugiu do pódio! O finlandês estava entre o satisfeito e o desconsolado por perceber que, sem aquele início, poderia ter lutado pela vitória: «Esta corrida mostrou que nunca se deve desistir, nunca se sabe o que pode suceder. Deu para me divertir e só foi pena que, no final, o Daniel já estivesse longe…».
Quem não escapou ao «shoey», apesar de ainda perguntar se já teria idade para aquilo, foi o mais jovem estreante na F1 a subir a um pódio! Ainda com 18 anos, Lance Stroll nem conseguia acreditar no que lhe estava a acontecer, após um fim-de-semana em que mostrou enorme evolução em termos de maturidade: «Estou sem palavras, nem sei o que dizer… Nem percebo bem o que acaba de se passar nesta corrida maluca, com todos a baterem à minha volta. Só quis manter-me afastado dos problemas, mas foi uma pena aquele final lado a lado com o Valtteri… As últimas duas corridas foram fenomenais e estou na lua!».
No meio desta loucura toda, há ainda a destacar os primeiros pontos para a McLaren, com Fernando Alonso a recuperar 10 lugares para terminar em 9.º, ganhando ainda o «prémio» da declaração do dia ao ver como a corrida se desenrolava e a desabafar pelo rádio: «Já viram que hoje podíamos ter ganho isto?». E também mais um ponto para Pascal Wehrlein e para a Sauber. Classificação:
Pos | Piloto | Equipa | Tempo/Dif. | Box |
---|---|---|---|---|
1 | Daniel Ricciardo | Red Bull | 2.03.55,573 h | 4 |
2 | Valtteri Bottas | Mercedes | a 3,904 s | 4 |
3 | Lance Stroll | Williams | a 4,009 s | 3 |
4 | Sebastian Vettel | Ferrari | a 5,976 s | 4 |
5 | Lewis Hamilton | Mercedes | a 6,188 s | 4 |
6 | Esteban Ocon | Force India | a 30,298 s | 4 |
7 | Kevin Magnussen | Haas | a 41,753 s | 3 |
8 | Carlos Sainz | Toro Rosso | a 49,400 s | 3 |
9 | Fernando Alonso | McLaren | a 59,551 s | 3 |
10 | Pascal Wehrlein | Sauber | a 1.29,093 m | 5 |
11 | Marcus Ericsson | Sauber | a 1.31,794 m | 3 |
12 | Stoffel Vandoorne | McLaren | a 1.32,160 m | 4 |
13 | Romain Grosjean | Haas | a 1 volta | 5 |
14 | Kimi Räikkönen | Ferrari | a 5 voltas (suspensão) | 5 |
— | Sergio Pérez | Force India | Travões/Suspensão | 5 |
— | Felipe Massa | Williams | Amortecedor | 4 |
— | Nico Hülkenberg | Renault | Despiste | 3 |
— | Max Verstappen | Red Bull | Motor | 1 |
— | Daniil Kvyat | Toro Rosso | Prob. eléctrico | 0 |
— | Jolyon Palmer | Renault | Motor | 1 |
Agora sim, a Fórmula 1 vai regressar à Europa para a verdadeira temporada no Velho Continente, começando pela fantástica paisagem alpina do Red Bull Ring. Dentro de duas semanas teremos o G.P. da Áustria para que a emocionante luta pelo título mundial deste ano possa prosseguir!